Por José Paulo Grasso
Como um secretário pode fazer uma afirmação desssas sabendo que somente 32% dos imóveis da cidade pagam IPTU? Hoje, dos mais de 2,2 milhões de construções residenciais e comerciais (sem contar salas) existentes na cidade – tanto no asfalto como em favelas e loteamentos irregulares, cerca de 710 mil apenas (32,22%) pagam IPTU, segundo a Secretaria Municipal de Fazenda. O próprio secretário-chefe da Casa Civil, Pedro Paulo Carvalho Teixeira, informa que a prefeitura deixa de arrecadar cerca de R$ 150 milhões por ano.
O município do Rio de Janeiro tem praticamente 6 milhões de moradores (IBGE). Metade mora em favelas ou similares e não possui sequer comprovante de residência, o que ocasiona o fato de essa pessoa ser invisível à sociedade, pois ao não possuir comprovante de residência não se pode abrir sequer um crediário. Sendo que o crédito é o principio básico da economia. Ou seja, dizer que o índice de desemprego está em 5% é uma falácia criminosa. O Ipea acabou de produzir um estudo demonstrando isso. O desemprego entre os mais pobres, que era 11 vezes maior em 2005, pulou para 37 vezes mais cinco anos depois.
As pessoas não moram em favelas porque gostam e sim porque foram levadas a isso pela deterioração das políticas públicas e privadas. Com o programa das UPPs e a instalação de apenas 14 unidades, 600 mil pessoas passaram de repente à formalidade e estão pagando por isso: conta de luz (social), net, água... Ainda faltam 2,6 milhões.
Com isso, a prefeitura aproveitou e em entrou com o programa Tolerância Zero para levar também à formalidade o comércio que ronda essas pessoas, as micro e pequenas empresas. Num momento inicial tudo parece estar funcionando. Contudo, a contrapartida exigida por essa entrada na sociedade será dada pelo município e pelo estado? Sem ela o futuro do programa será comprometido.
Sabidamente, não há verba para investimento porque não há um aumento de arrecadação que permita isto, porque o setor produtivo está seriamente afetado por meio século de incúria administrativa que levou a um estado de guerra civil, que culminou com a exigência das UPPs. É o cachorro mordendo o próprio rabo. O que vamos fazer, ficar esperando que a situação se resolva sozinha? Ou vamos acordar e fazer como outras cidades que se reinventaram? Todas tinham um projeto sólido que uniu toda a sociedade. E aqui, como vai ser?
Como a indústria foi expulsa para a economia voltar a funcionar e absorver estas pessoas à formalidade, é necessário que haja um planejamento de longo prazo, com uma âncora clara, plano diretor com metas factíveis e principalmente envolvimento de todos. Deveria ser discutido por toda a sociedade, mostrando as mudanças e obviamente seus ganhos para que quando fosse implantado, obtivesse sucesso. E isso não é sequer pensado, quanto mais discutido.
Na Colômbia, de onde foi trazido o conceito das UPPs, como não houve esta contrapartida, a violência voltou e de forma mais acentuada. Na década de 90 o índice era de absurdas 80 mortes por cem mil habitantes. Com os investimentos governamentais com dinheiro americano diminuíram para 18, número ainda elevado, mas bem melhor. Hoje, com o fracasso do programa, os índices estão beirando 94 mortes por cem mil habitantes. Será que é isso que queremos pós-2016? Hoje os índices aqui no Rio são acima de 28 mortes por cem mil habitantes. São Paulo, mesmo com uma continuidade de políticas públicas de mais de 20 anos, está pouco acima de 10 mortes por cem mil habitantes. O Rio está fazendo como a ONU fez no Haiti, o minustah, mas não revitalizou a economia e os pobres comem bolachas de barro. Lá é um caldeirão a ponto de explodir; e aqui? A realidade das áreas suburbanas é diferente? Sem revitalizar os subúrbios, quando o Rio deixará de ser a “Cidade Partida”?
Está na hora de a sociedade acordar. Caso contrário, os investimentos de R$ 50 bilhões programados terão o mesmo efeito do Pan de 2007, ou seja, só elefante branco e nenhum benefício para a cidade. Tão somente a vergonha de termos perdido a última oportunidade de nos reinventarmos e de termos errado duas vezes seguidas.
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