segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Como o Rio de Janeiro pode ser tornar a vanguarda mundial da economia verde e autossustentável


Por José Paulo Grasso

Há 20 anos o Rio estava fervilhando de ideias e esperanças, pois promoveríamos a Eco-92, uma novidade em termos de planejamento mundial provocada por um consenso entusiasmado de que o mundo teria de se tornar sustentável.
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A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD) foi realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro e objetivou buscar meios de conciliar o desenvolvimento sócio-econômico com a conservação e proteção dos já ameaçados ecossistemas da Terra. Para isso foi aprovado um conceito de desenvolvimento sustentável que conscientizou o mundo de que os danos ao meio ambiente eram majoritariamente de responsabilidade dos países desenvolvidos. Reconheceu-se, também, a necessidade dos países em desenvolvimento receberem apoio financeiro e tecnológico para que o mundo passasse a ter um desenvolvimento sustentável.
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Nesta mesma época o Rio pensava seu plano diretor, pois a cidade após 30 anos da perda da condição de capital federal e suas benesses estava em franca decadência, vitimada por administrações públicas danosas e já se tinha percepção de que a sociedade deveria se unir e agir para resgatar nossa qualidade de vida.

Parece que foi ontem, mas já se passaram 20 anos e… a situação piorou muito em todos os sentidos e sentimos na pele as consequências dessa irresponsabilidade mundial, pois a situação climática deteriorou-se rapidamente, confirmando estudos como o IPCC (Intergovernmental Painel of Climate Change – 2007), que mostram que os impactos são realmente causados pelos seres humanos. Tenebrosamente, ela vem impactando o meio ambiente indistintamente, mas, infelizmente, quem sofre são sempre os desfavorecidos.


Mesmo com tudo que está acontecendo, o lobby econômico continua intransigente, nenhum protocolo foi definido para que possamos reverter o aquecimento global e a oportunidade da vez é a Rio+20 que acontecerá em junho. Sua estratégia será avaliar e renovar os compromissos com o desenvolvimento sustentável assumidos pelos líderes mundiais na Eco-92, discutir a contribuição da economia verde para o desenvolvimento sustentável e a eliminação da pobreza, além do debate sobre a estrutura de governança internacional na área do desenvolvimento sustentável. O modelo de consenso, que só permite decisões com a aprovação de todos os países, foi finalmente questionado na 15ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em Copenhague, que, claro, terminou sem acordo por divergências entre os países ricos e em desenvolvimento sobre as ações necessárias para enfrentar o aquecimento global. Esta atitude criminosa deveria ser repudiada em uníssono por todos, porém, mais uma vez o Establishment está prevalecendo sobre a qualidade de vida, o que é inadmissível! Até quando?


A Rio+20 é de fundamental importância, pois irá agrupar todos os países para debater temas que só são discutidos a cada década ou duas, como a convenção do clima, que é a maior negociação econômica do mundo, criada na Rio 92. Será discutido o conceito de um economista inglês (Thomas Malthus) que pregava o controle populacional dos países em desenvolvimento, porque senão eles irão consumir os recursos que os desenvolvidos precisam. Quer ingerência maior? Ainda mais no atual cenário mundial no qual os países em desenvolvimento estão gerando uma classe média e os desenvolvidos estão empobrecendo? Como é que vai ficar o conceito de qualidade de vida? A classe média americana tem “direito” a ter quatro carros e a indiana a andar de bicicleta? Com problemas como esses dificilmente vão haver decisões de consenso, já que nas próximas décadas há uma previsão de que centenas de milhões de pessoas deixarão de ser pobres e, neste cenário, será rigorosamente necessário repensar os padrões mundiais de consumo, dentro do conceito de autossustentabilidade. Ou seja, não há espaço para 7 bilhões de pessoas consumirem como a classe média americana ou italiana. E agora? O Brasil quer sustentar uma posição nessa discussão, que não priorize simplesmente o meio ambiente e sim o fortalecimento do desenvolvimento sustentável, do tratamento equilibrado entre econômico, ambiental e social. Nesta crise econômica mundial, quem está sofrendo seus efeitos não quer nem pensar nisto e sim focar – apenas – no meio ambiente.


É preocupante que não se fale no fator cultural e na educação, que são as únicas coisas que podem unir toda a sociedade e exigir a transparência total, coisa que é tabu. Hoje, depois de décadas de neoliberalismo, que foi o responsável comprovado por esta crise mundial em que os lucros foram privatizados e os prejuízos socializados, é no mínimo estranho que não se fale em acabar com essa irracionalidade econômica que acentuou o abismo social acabando com a proporcionalidade existente entre quem estava no topo e na base da pirâmide. Este desequilíbrio é o principal fator que ainda provoca situações absurdas em pleno século XXI, em que determinados países africanos que comerciam “legalmente” com os desenvolvidos obrigam famílias e suas crianças a comerem em dias alternados porque as elites locais mafiosas criminosamente as exploram, para que suas riquezas minerais ou agrícolas sejam roubadas para manterem os lucros absurdos de determinados grupos econômicos. Com o detalhe que logicamente nestes locais não há a menor preocupação ambiental e não se fala neste assunto!


Sem que a parte cultural seja atacada para que injustiças absurdas como essas parem de acontecer, além de programas transparentes para inibir essa busca neoliberal pelo lucro sem medir as consequências sociais, jamais poderemos ter sustentabilidade, sendo que os mecanismos para criarmos isso estão à mão como os que impedem a lavagem criminosa de dinheiro por mecanismos corruptos internacionais.


O pensamento que será apresentado pelo Brasil é o de que os empresários serão a chave do sucesso da Rio+20, porque ela irá tratar de investimentos em longo prazo, assunto que sociedades acostumadas ao stop & go dos voos de galinha da economia nacional ainda não dominam. Segundo esse dogma, o empresariado precisa de segurança com relação ao longo prazo, mas, como sabemos, mesmo com a estabilidade do Real, até hoje incrivelmente não se fez um planejamento em curto, médio e longo prazos, com âncoras sólidas e metas factíveis que permitam que esses cenários possam ser vislumbrados e, dependendo de sua credibilidade, sejam aceitos e trabalhados pela sociedade. Na Eco-92, quem apoiava o desenvolvimento sustentável era ligado a uma visão idealista do mundo, líderes empresariais convictos de que a dimensão social e ambiental eram a chave. Hoje, pressionados por organizações que exigem cuidados sociais (escândalo da Nike com o trabalho infantil no Paquistão) ou ambientais (boicote ao atum que matava golfinhos), empresas que evitaram tais problemas começaram a ter lucros altos, pressionando para que esses paradigmas modernos passassem a ser levados em consideração. Esta ótica quer convencer o empresariado médio e micro de que devem investir em sustentabilidade e não só as grandes e ricas multinacionais. É interessante salientar que o mercado mundial está cada vez mais seleto e os exportadores agora têm que estar atento a essas nuances para não deixarem de ser competitivos, porque agora estão sendo exigidos até selos de boa governança e padrões éticos em países que tem políticas públicas de combate à corrupção corporativa, como os EUA.


Os problemas a serem enfrentados abordam temáticas que já deveriam estar sendo discutidos há muito tempo por nossa sociedade que continua alienada bovinamente. Vão desde a tal de “economia verde”, que tem enorme poder de transformação quanto às mazelas sociais, mas que até agora não foi discutida e nem regulamentada, passando pela indústria do “crédito de carbono”, que não possui fiscalização e, portanto, credibilidade, parecendo a bula da salvação que era vendida aos pecadores pela Igreja Católica no passado. Chegando até aos efeitos cruéis do aquecimento global sobre o semi-árido nordestino, que até hoje ainda sofre com a famigerada indústria da seca, como aqui sofremos com a gananciosa indústria da emergencialidade em função das chuvas de verão, passando pela reforma agrária que nunca sai do papel. Irá se repetir aquele tradicional cenário de “muito cacique para pouco índio”, porque estes assuntos de grande interesse não serão tratados nos salões com os grandes líderes e sim no Aterro do Flamengo.


O que nós cariocas e fluminenses podemos aprender com isso e que poderemos aplicar aqui é o que deveria ser priorizado, porque estamos diante de uma oportunidade única de nos reinventarmos, como outros lugares que tinham problemas iguais ou piores do que os nossos, que conseguiram dar a volta por cima e hoje se tornaram modelos de sustentabilidade e qualidade de vida. Temos exemplos fantásticos, como o do aproveitamento dos recursos hídricos que hoje já são até discutidos à parte em mercados comuns, tamanha a riqueza que isso pode proporcionar num mundo com total carência de água potável. O Rio já tinha preocupações ecológicas desde o tempo do império, pois nossos mananciais secaram em função da monocultura, o que desertificou nossas periferias. Por isso temos a maior floresta urbana replantada do mundo e que junto com outras estruturas geológicas compõe o colar de atrações diversificadas que acentuam nossa beleza natural, apontada de forma unânime como a de maior potencial turístico do mundo, a cidade dita maravilhosa. Como uma mulher bonita que sabe valorizar seus atributos, o Rio não pode desperdiçar os seus por causa de administrações corruptas que estão destruindo este paraíso que bem administrado se tornará um sonho de consumo mundial.


E qual é o aproveitamento que é dado a essa privilegiada natureza, que bem desenvolvida se constituirá numa verdadeira mina de ouro? Nenhum! E que ao ser planejada em curto, médio e longo prazos traçará parâmetros inovadores no campo da economia verde, pois aliada à indústria do turismo se pode entrar em todos os segmentos da sociedade, aumentando a renda per capita, produzindo uma qualidade de vida única e substanciais ganhos em todos os sentidos, eternizando nossa tão badalada beleza natural. Por que isto até hoje não foi levado a sério?


O que vemos, dezoito anos depois do primeiro contrato assinado com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para o início do processo de despoluição? Os dejetos industriais e de cidades da Baixada Fluminense continuam desaguando na Baía de Guanabara, descaradamente, mesmo depois de R$ 1 bilhão em investimentos. Existem escândalos para todos os gostos e nada é apurado, mesmo com a qualidade de vida de todos indo para o buraco em todos os sentidos. Temos exemplos positivos como em Londres, com a despoluição do Tamisa, que permite que salmões venham do mar aberto para desovar nas cabeceiras dos rios que compõem sua bacia hidrográfica, em águas límpidas e propícias para o desenvolvimento de seus filhotes, o que incrementou sobremaneira o turismo nestas localidades. Nova iorque, por exemplo, aproveitou a união de toda a sociedade na década 70, quando emergiu de uma decadência total, para criar um mecanismo para eternizar sua água potável, o que hoje é um fato consagrado, pois ao se sentar em qualquer estabelecimento ela é oferecida diretamente da bica. Com isso para cada U$ 1,00 investido, são economizados U$ 7,00 em produtos químicos, sem contar o desgaste evitado para eliminar esses rejeitos químicos do meio ambiente. As margens dos rios são protegidas por lei que obriga a preservação da vegetação original, mesmo cortando cidades e fazendas, obrigando até mesmo a pontes que servem para atravessar gado a terem soluções higiênicas para impedir a poluição dos rios. Soluções simples, mas muito eficientes!


A Baía de Guanabara despoluída significará milhares de novos empregos, uma nova visão do Rio tal a beleza do seu entorno e a riqueza da fauna e flora que voltaria a habitá-la, tornando-a um imenso aquário natural, visitado por baleias, golfinhos, entre outras espécies que retornarão, além de permitir a visitação de seus manguezais, verdadeiros santuários celebrando origem da vida, dentro de um entorno com grande variedade de histórias e “causos” para contar. Hoje a construção civil e a indústria imobiliária são os pilares das grandes cidades cada vez mais inchadas pelo abandono do campo, em função da mecanização da agricultura, mas não há um planejamento que os transforme numa atividade que se eternize com crescimento planejado, dotando o Rio de uma qualidade de vida única e que lhe dará a vanguarda mundial. Por que não se pensar a economia verde a partir do exemplo que pode ser implantado no Rio, através de um planejamento com desenvolvimento sustentável e autossustentável de nossa beleza natural, via união de todos para traçarmos um master planestratégico de curto, médio e longo prazos que apresente uma visão de futuro na qual todos se sintam inseridos sem gentrianismos? A construção civil e indústria imobiliária se desenvolverão sustentadas pela recuperação total dos serviços públicos e privados, levando crescimento socioeconômico, cultural e ambiental a todo o Rio de Janeiro.


Podemos pensar a cidade de forma que seja boa para o visitante e principalmente para o morador, que passará a ver o Rio como um aliado na sua melhoria pessoal e na de sua qualidade de vida. Será criado um ambiente propício à proliferação de centenas de milhares de micro e pequenas empresas para atender a um fluxo inicial de 25 milhões de visitantes anuais (ACRJ) e ao aumento do poder aquisitivo dos moradores. Isto levará a atração do setor de serviços nacional e internacional, de fábricas, indústrias que serão seduzidas pelo poder aquisitivo de nossos visitantes de qualidade, pelo turismo de negócios e da indústria criativa em todas as suas nuances, sem falar no aumento da arrecadação em U$ bilhões e na recuperação econômica do Rio, a partir de uma revitalização da área portuária que soerga a economia em todos os setores, incluindo favelas, subúrbios e periferia, e não do modo prosaico que está sendo feita atualmente.


Com tal volume de visitantes dentro de uma estrutura planejada para atraí-los, diverti-los e, principalmente, entretê-los dando-lhes condição para que descubram exatamente o que querem fazer dentro de uma estrutura voltada para que se enriqueçam culturalmente, o Rio se tornará a vanguarda mundial do setor, ao mesmo tempo em que as obras de infraestrutura serão executadas, já aprovadas em cima de planos de negócios feitos em cima desta demanda. Hoje, por exemplo, o Rio apresenta enorme potencial em relação a sua natureza privilegiada e que não é explorada de forma sustentável e sim de forma informal acarretando com isso danos irreparáveis a nossa flora e fauna. A partir do momento que as áreas de proteção ambiental (APA) tiverem planejamento integrado com as comunidades que as rodeiam e o mundo que nos visita, a relação com o meio ambiente passar a ser explorada de uma maneira sustentável e autossustentável, gerando ganhos em qualidade de vida que serão repartidos entre todos os setores envolvidos, a sociedade conscientizada exigirá a preservação ambiental compartilhada porque passará a ver nela uma forma de ganhos infindável, sendo que a quantidade de desdobramentos que advirá de tal mudança de postura entusiasmará toda a coletividade, permitindo uma conscientização cidadã que tornará morador e visitante aliados para que essa relação se estabilize e passe a influenciar decisivamente a qualidade de vida do RJ.
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Com isso, o Rio passará a adotar mudanças ecológicas com enfoque na integração natureza/cidade, permitindo, por exemplo, que observadores da natureza, de pássaros, borboletas, baleias e animais terrestres ou marítimos encontrem aqui seu paraíso, mas simultaneamente possam aproveitar as vantagens de uma megalópole como cultura, moda, shows, compras, gastronomia, esportes radicais, educação, medicina etc., numa mistura única e dentro de uma qualidade de vida excepcional, com uma coletividade que saberá retirar seu sustento direto ou indireto desta relação privilegiada. Será o exemplo prático ideal de economia verde ao criar empregos em todos os patamares da população, eliminando a miséria e sua violência, gerando inclusão social, a preservação ambiental e de todo o patrimônio material e imaterial, sem esquecer-se da indústria criativa, estimulando a educação ao oferecer perspectivas sólidas de futuro aos jovens, perpetuando a qualidade de vida e demonstrando a importância de um planejamento democrático realizado por toda uma sociedade unida e participativa. O que estamos esperando?
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Cidadão do Rio, como bem disse Rui Barbosa, aquele que não luta pelos seus direitos, não é digno deles e nem merece viver. Acorda, Rio, porque a chance é única e não pode ser desperdiçada!

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