terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

A cidade, o legado – uma década que será perdida


Por José Paulo Grasso
Engenheiro e coordenador do Acorda Rio
 
Nossa única certeza em relação ao futuro é que temos total capacidade de influenciá-lo, desde que façamos um planejamento crível que una toda a sociedade de forma transparente, enfrentando e enquadrando a “suposta” corrupção reinante. O Rio e sua beleza natural privilegiada sempre atraíram a intelectualidade, influenciando-a para lançar modismos mundiais positivos, tais como o Samba, o Carnaval, a Bossa Nova, o Chorinho, entre outras manifestações culturais. Porém, com sua decadência contemporânea, passamos a disseminar malfeitos em série, o que definitivamente não é a nossa vocação. Precisamos nos reinventar!
 
É incrível o que a falência administrativa do RJ tem provocado: desde catástrofes ambientais, passando por poluição desenfreada, que contaminou praticamente todas as praias do Rio tornando-as verdadeiros focos de doenças neste verão, até a volta da dengue. Este colapso abrange os mais diversos setores de serviços públicos e privados, em que a corrupção aliada a absurdos erros gerenciais está arrasando a qualidade de vida cidadã e que em suas sucessivas trapalhadas culminou com o simbólico desmoronamento do edifício Liberdade, uma construção que levou de roldão mais duas edificações, expondo toda a incapacidade da prefeitura em lidar com situações inesperadas, pois chegou a jogar os corpos das vítimas num lixão. Todas essas tragédias ao longo dos anos já ceifaram milhares de pessoas e suas expectativas de vida. Até quando?
 
Isto tudo não está acontecendo por acaso e sim porque as ideologias no Brasil, tanto de esquerda quanto de direita, se referem “suposta” e exclusivamente a mão usada para roubar, o que permite a conclusão lógica que a de centro é ambidestra. Só que infelizmente isto não é piada e sim uma tenebrosa realidade administrativa oferecida à exaustão em qualquer mídia, em todos os recantos desta nação. As mais diversas atividades estão sendo paralisadas por que os TCUs estão comprovando irregularidades em todas as prestações de conta. Claro que isso não está acontecendo à toa e é resultante da nossa alienação bovina, da total falta de participação da sociedade num regime que primordialmente a exige, a democracia, que não tem, por conseguinte, uma imprensa prestadora de serviços à sociedade de forma íntegra, ética e verdadeiramente independente. O que leva os “espertos” que estão participando a se sentirem no direito de se associarem para notoriamente assaltarem os cofres públicos. Isto vem se degenerando há décadas e hoje virou uma rotina cotidiana nojenta, que todos repudiam, mas, por total falta de novas lideranças confiáveis, não nos animamos a revertê-la, o que explica a magérrima participação popular nos movimentos anticorrupção.
 
É incrível como menos de 0,5% da população pode praticar toda a sorte de ilegalidades, no executivo, no legislativo e no judiciário prejudicando de forma tão ostensiva uma nação inteira, que assiste e não reage. A situação é tão absurda que, por exemplo, uma manifestação pública justa de bombeiros e policiais, pois recebem os piores salários do Brasil, na zona sul do Rio e que recebeu mais de 10 mil pessoas não obteve sequer uma linha nos jornais. Por outro lado, descobre-se, graças a brigas internas, que os morosos poderes judiciários do RJ e de SP criaram mecanismos legais que inflaram seus salários em mais de 600%, à custa de cobranças judiciais e outras taxas, arrecadando assim um butim que financiava e continua a financiar esta farra salarial completamente ilegal, pois existe um teto criado especialmente para coibir estes abusos. Será que agindo assim esses juízes terão isenção para julgar os serviços públicos, que se converteram num escárnio aos direitos dos cidadãos, que atualmente no Rio só tem deveres, que devem ser cumpridos a risca, porque se não a lei é aplicada? O legislativo, logicamente, está unido na defesa de seus próprios interesses, em se perpetuar como descobrimos, garantindo as autoridades à impunidade total.
 
A situação está tão desavergonhada que o Governador do RJ vive regularmente em Paris (?), sem prestar satisfações. E como ficou claro no episódio da queda do helicóptero viajando em conluio com empresas privadas que se beneficiam desta aproximação; como hoje a moralidade está em recesso, seu antigo aliado, com reputação mais suja que pau de galinheiro, entrou com requerimentos pedindo todas as informações pertinentes às suas repetidas viagens, exigindo saber datas, vôos e, logicamente, quem o acompanhou, já que por exercer um mandato público tem-se que obrigatoriamente de prestar satisfações à sociedade. Claro que os vereadores e deputados se negaram a fornecê-las, obrigando então a uma apelação a esta “justiça”, que parou em alguma gaveta, já que até agora não se obteve nenhum retorno. Com este comportamento de coronel maranhense, não é difícil entender porque todos os índices do estado, que é o segundo maior PIB, estão igualados aos piores de todos os estados da federação e porque o ICMS de 2010 foi menor do que o de 1995, mas dessa vez não aparece um escândalo fiscal com o do Silverinha de triste memória. E os outros 99,5% da população até quando suportarão tamanho descalabro administrativo?
 
Já no âmbito municipal que precisa se reeleger, a situação consegue ser ainda pior, inacreditavelmente. Eles estão tentando através daquela mídia “isenta” e que prega a “liberdade de imprensa” convencer a população que agora “o Rio vai”, embora não se saiba para onde porque não há um planejamento apresentado, nem intenção de fazê-lo. E sem isso, obviamente não se chega a lugar nenhum. Muito descaramento.
 
Um professor universitário publica no Globo, na maior “cara de pau”, que as favelas cariocas terão o mesmo destino das cidades medievais européias e das ilhas gregas que inicialmente eram moradias populares e que hoje desfrutam de arquitetura e beleza singular, graças à prefeitura, que prometeu que suas urbanizações seriam um dos principais legados olímpicos. Será que alguém em sã consciência acredita num disparate destes ainda mais envolvendo a nossa tristemente “famosa” administração pública municipal? Aliás, e a Cidade da Música? A preocupação do mestre é explicada porque o IAB, daquele mesmo grupo que projetou o novo centro de convenções e depois admitiu que não entendia nada daquilo, promoveu um concurso no qual foram “escolhidos” 40 escritórios técnicos de arquitetura para torrar os bilhões em verbas carimbadas do Banco Mundial, elaborando projetos de urbanização e de melhorias habitacionais em diversos agrupamentos das ditas comunidades e até agora o prefeito não se manifestou se esta mamata vai rolar ou não.
 
É interessante que no afã de justificar estes gastos injustificáveis, ele enfeita o artigo, falando que as favelas “usam soluções criativas, de uma variedade extraordinária de soluções técnicas e culturais, transmitidas de geração em geração, através de um rito de passagem” (?) defendendo em pleno século XXI, que a sexta economia mundial incentive esse horror que é uma favela, com todas as precariedades conhecidas que se somam a moradias insalubres e inadequadas, verdadeiros focos de doenças respiratórias entre outras, para justificar que seus “supostos” apadrinhados tenham acesso a essa verba bilionária. Será uma briga feia porque na Rocinha, por exemplo, já existe outro projeto concursado e aprovado, resultado de anos de trabalho de um grupo rival, completamente diferente do padrão atual, de obras faraônicas, onde os mesmos de sempre, faturam e os moradores ganham o que não querem e tem até um justificado receio de usar. Como no Complexo do Alemão, onde o uso do teleférico até hoje não decolou porque como a “manutenção” no RJ é por demais conhecida, todos têm medo de embarcar nessa “canoa furada” e sofrer um “acidente” como o do Bondinho de Santa Tereza, tragédia que foi pré-anunciado diversas vezes até a fatalidade acontecer.
 
Até agora não foi explicado no que sua verba de manutenção foi gasta, embora se saiba que ela sumiu, mas aquela mídia “isenta” não toca no assunto. Aliás, aqui no Rio, até um romântico passeio de pedalinho da Lagoa pode terminar em tragédia, porque a fiscalização só acontece após o desastre como no episódio com mortes do parque de diversões. Acidentes acontecem, mas alguém já viu essas coisas ocorrerem em outros lugares com a frequência daqui? Toda semana! Porque será? Precisamos dar um basta às más administrações e à corrupção e ao desserviço da imprensa carioca.
 
Seriam até cômicas as diferenças de opinião entre articulistas, se não fosse trágicas. Outro do mesmo jornal, que se enveredou por uma corrida pela Rocinha, apresenta um quadro totalmente diferente do traçado pelo professor, desmoralizando sua tese, ao apresentar um balanço mais realista do que é ter que passar só uma única vez e mesmo assim correndo pelos becos e meandros de uma favela, tendo que driblar todas as mazelas existentes e aproveitando para propagandear os supostos efeitos das UPPs, o verdadeiro motivo da realização da prova e do artigo. Já a da Folha de SP, ao término de sua visita ao Vidigal, com sua tão decantada vista privilegiada da cidade, encerra qualquer tentativa de diálogo com o seguinte comentário: “Da próxima vez que vierem glamorizar favela para mim, eu meto uma estopa suja de graxa na boca de quem falar”. Ninguém revela que o favelado, como qualquer ser humano, quer trabalhar, ter renda para comprar sua casa e dignidade para escolher sozinho como e onde viver com qualidade de vida, opção que inexiste nas comunidades. Ocupar favelas com policiais armados e torrar o dinheiro carimbado do Banco Mundial em programas sociais não resolvem os problemas existentes. Onde estão os empregos e a sonhada revitalização da economia? Até quando a parcela mais pobre da população será usada como massa de manobra eleitoreira pelos nossosdesgovernantes, como vimos acontecer no medonho episódio do Pinheirinho em SP?
 
Para fechar com “chave de ouro” o ciclo de barbaridades contra a cidadania democrática só faltava um artigo sobre as olimpíadas. Bingo! Ele apareceu assinado pela Empresa Olímpica Municipal do RJ (?)! O título, A cidade e o legado, não pode ser mais sugestivo. O texto insidiosamente lembra que “o COI, Comitê Olímpico Internacional (depois do escândalo Grego, bem entendido) no capítulo I da carta olímpica recomenda a adoção de medidas que promovam um legado olímpico positivo na cidade sede. Nesse enfoque os jogos são vistos como uma possibilidade impar para discutir (?) e alavancar (?) o desenvolvimento das cidades onde ocorrem. Neste contexto os chamados mega eventos tornaram-se indutores (?) de políticas urbanas e de parcerias público privadas, aceleradores da economia e impulsionadores de praticas de sustentabilidade, melhorias ambientais e de infraestrutura, de integração social, regeneração urbana, acessibilidade, mobilidade, conectividade e outras dimensões deste universo cada vez mais complexo das metrópoles contemporâneas”. E “a meta buscada pela prefeitura é de construir um legado urbano permanente (?), cujo valor material se aproxime do valor do investimento realizado, contribuindo para que o Rio seja reconhecido na próxima década como a melhor cidade do hemisfério sul para viver, trabalhar e visitar”. Dá para acreditar nisto? Num cantinho no final, sem nenhuma convicção, se anuncia as tais realizações.
 
Este belo discurso inicial, qualquer um assina embaixo, agora será que uma prefeitura que aumenta seus gastos de comunicação em 9.000%, com claro intuito de influenciar a mídia, tem credibilidade para sustentar tais ações? Vamos analisá-las e verificar suas viabilidades.
 
“Grande aumento na oferta de transportes de alta capacidade, os BRTs”. Eles usam essa sigla com letras maiúsculas e em inglês, achando que assim irão enganar a população e mascarar que estes projetos, ao serem inaugurados, já estarão obsoletos, como todos os especialistas já se cansaram de provar. Coritiba, que foi o berço disso, ônibus articulados se deslocando em um corredor próprio, ao constatar que estavam arcaicos, desistiu e está implantando trens de superfície. Como os que agora querem colocar na área portuária sem apresentar a fonte da verba, ou seja, mais um factóide como nos tempos do alcaide anterior que, aliás, foi o mestre do Eduardo Paes. A máfia dos ônibus tem grande influência na prefeitura, para conseguir que se invista uma fortuna numa estrutura que sabidamente não vai suportar a demanda, mas que mantém seus privilégios. Ou seja, um escândalo! Com o detalhe que querem que os turistas usem este meio de locomoção ultrapassado, ou seja, iremos passar uma impressão de sermos primitivos tecnologicamente na chegada do visitante. Que vergonha! Sem falar do estado dos aeroportos que são péssimos e onde notoriamente nada funciona adequadamente denegrindo a imagem do Rio já no desembarque. Até quando permitiremos estes absurdos?
 
Além disso, as desapropriações para os BRTs no Porto Maravilha ocorrem no arrepio da lei e obviamente “aquela mídia” ignora estes fatos. O COI foi noticiado disto e claro que não se pronunciou sobre o destino de centenas de famílias que moram onde as obras de melhoria passarão. Até quando esse neoliberalismo?
 
O Porto do RJ é um capítulo a parte, não sendo mais sequer mencionado como legado, tamanha a lambança que será feita com a construção de um novo píer em formato de Y, pago com dinheiro público para atender uma empresa privada. Além de não haver espaço físico no local, que permita que companhias de turismo e taxis prestem um atendimento profissional a milhares de pessoas que desembarcam simultaneamente dos transatlânticos. Até agora esse problema não foi solucionado e pelo visto não será porque planejamento não é o forte da municipalidade, já que gastaram milhões para reformar a rodoviária e agora estão falando em levá-la para outro local. O fato é que: “supostamente” o ideal é fazer e refazer obras comissionáveis.
 
Com relação ao metrô para a Barra, que não tem projeto definido, mas contrato incrivelmente assinado, (imagine os aditivos e para qual estratosfera irão estes custos) os especialistas são unânimes em desmentir os ditames do COI, porque ele será construído unicamente para atender as necessidades olímpicas. Dificilmente poderá atender as estações intermediárias porque já sairá lotado, impossibilitando embarques, como muito bem explicitou um líder comunitário, que mora no meio do caminho. Se o metrô hoje já está um caos, imagine quando houver as novas interligações. Ele conseguiu um feito único, todas as associações de bairro se uniram contra, porque do jeito que está sendo apresentado ninguém quer! Solução? Vão decretar feriado nos grandes eventos, porque assim a cidade se esvazia e, portanto, não aparecerão problemas!
 
Outro absurdo citado é o Porto Maravilha (para quem?) que é um amontoado de aberrações. Começa pelas CEPACs, que deveriam estar sendo usadas necessariamente para resolver o conhecido problema de trânsito daquele eixo rodoviário, que absorve mais veículos que pode suportar, estando há anos com sua vazão completamente comprometida. Sabendo-se que há uma previsão de mais cinco mil edificações só na Zona portuária, muitas com até 50 andares, com o correspondente aumento de veículos e contando com o incremento anual da frota automobilística, como se dará o deslocamento por lá, que até agora não tem previsão de aumento da demanda? Porque demolir um elevado que é funcional, dando um nó na circulação local por supostos motivos estéticos? Ainda mais a um custo bilionário que suspeitamente não irá passar pelo crivo de um tribunal de contas, para refazê-lo subterrâneo numa área sujeita a inundações? Para que esse dispêndio de dinheiro se isto não irá proporcionar um aumento de vazão num local que já é um caos quando o correto seria solucionar definitivamente este problema viário? Com o agravante que, todos os lugares do mundo que revitalizaram suas áreas portuárias aproveitaram para revitalizar suas economias via um planejamento de curto, médio e longo prazos que em todos os casos envolveu como âncora a indústria turística. Por que aqui, além de nada do que deu certo em outros lugares estar sendo feito, ainda se prioriza uma especulação imobiliária devastadora que após 2016 atirará a economia num absurdo colapso?
 
A secretária de fazenda está em viagem internacional tentando vender o Rio e o Porto Maravilha para empresários estrangeiros, pois parece que os nacionais não se interessaram, como podemos deduzir, já que o Porto Maravilha, mesmo com todas as vantagens oferecidas, ainda não decolou. Mas como atrair o empresariado se o Rio não oferece uma concentração de pólos de negócios? As empresas de sucesso, ou ao menos as que dão grande contribuição para a economia de uma região, não existem isoladamente. A prosperidade depende da aglomeração e não do empresário individual. Como ainda não existe o menor planejamento que atraia empresas para que essa ação da secretária decole, fica muito difícil que seu Road Show obtenha sucesso, porque como diz o ditado “uma andorinha só não faz verão”.
 
Outra ação, a ampliação do Sambódromo traz um megaprojeto que irá se somar a outras construções já anunciadas, como o complexo com o novo Centro de Convenções Internacional, contribuindo para aumentar cada vez mais o trânsito no eixo da caótica Av. Francisco Bicalho e Rodrigues Alves. O CCI era visto como um dos principais legados, porém, como foi denunciado aqui, que seu idealizador admitiu não entender nada de centro de convenções e que sua concepção esta errada, nem se toca mais nesse assunto. Será que quem anda de metrô acredita que ele, que já funciona pessimamente hoje estará melhor em 2016, ainda mais como o aumento de demanda aguardado? Outra obra será o parque olímpico da Barra (Lembra da Vila do Pan, que se encontra sub judice, várias promessas não foram cumpridas pela prefeitura, se encontra em péssimo estado e praticamente vazia com apartamentos indo a leilão?), cuja área tem promessas de valorização porque lá serão construídos o Parque Olímpico Rock in Rio, (?) o Museu do Futebol, e onde haverá a expansão do Riocentro. Essas são as melhorias materiais anunciadas pela prefeitura. Dá para convencer?
 
Melhorias que todos apóiem na infraestrutura da cidade trazendo desenvolvimento socioeconômico, cultural e ambiental às favelas, subúrbios e periferia, que deveriam ser as diretrizes de todo este investimento bilionário, nem pensar. Onde estará um projeto que revitalize uma economia tão arruinada? Dá para crer que com este legado sem vergonha, que tem que ser apresentado quase pedindo desculpas, a prefeitura conseguirá que o Rio seja reconhecido na próxima década como a melhor cidade do hemisfério sul para viver, trabalhar e visitar? Uma séria investigação deveria ser feita para se saber até que grau empresas midiáticas cariocas estão mergulhadas nesse mar de lama público. Por que desperdiçar tão cinicamente uma oportunidade de reinventar o Rio com ética e qualidade de vida, esses bilhões de investimentos que terão que ser pagos por aqueles 99,5% da população que não está sendo levados em conta? Não dá para se jogar fora uma oportunidade dessas assim.
 
Estamos assistindo uma crise mundial que está levando economias ditas de primeiro mundo à bancarrota e queremos repetir isso aqui? Como todos sabem, estes países se atiraram numa farra imobiliária neoliberal tipo pirâmide, onde os preços fugiram irresponsavelmente da realidade, o que culminou com esta quebradeira, trilhões de dólares virando pó, milhões de empregos desapareceram, bancos centenários falindo, proporcionando que o famigerado FMI, que foi incapaz de perceber que tinha alguma coisa errada debaixo do próprio nariz, volte a receitar aquele corolário de corte de investimentos que achata a população. Como diz o ditado “onde falta o pão, ninguém tem razão”, todos estão se desentendendo, promovendo desdobramentos sem fim de uma crise, onde a parcela da população que não teve nada com isso é que está sofrendo as consequências. Assim acabaram as ideologias e todos só pensam em salvar sua qualidade de vida, que está indo para o brejo. E nós, vamos aceitar trilhar este caminho de especulação desenfreada que estamos assistindo por total irresponsabilidade de nossos governantes e seus aliados (na mídia)? O tais 0,5% da sociedade?
 
Aquele mega especulador, o Sam Zell, que previu a crise mundial, denunciou que a especulação imobiliária aqui estava demais, vendeu tudo e se foi. Como as oportunidades são excelentes no Brasil, voltou, mas para o Paraná. Eixo RJ e SP nem pensar! E nós vamos permitir que isso aconteça?
 
A economia brasileira está apoiada em commodities minerais e agrícolas que por sua alta mecanização não geram os tão necessários empregos a população do interior, empurrando-a para as cidades. Produzimos alguns manufaturados, mas a grande indústria empregatícia é sem dúvida a automobilística com seus desdobramentos rodoviários. Com a crise mundial o mercado interno sofreu um grande impulso com o PAC, que estimulou a indústria imobiliária e a de construção civil para atender as grandes demandas internas, a da casa própria e infraestrutural. Foi dado um salto mercadológico, criando uma nova classe C, onde um pedreiro passou da informalidade a um salário formal que lhe permite consumir e sonhar. Você leitor sabia que isso movimenta uma diversidade enorme de segmentos, passando do mineral como saibro, brita e aréola, para produtos industrializados que vão de asfalto, pisos, cerâmicas, telhas e tijolos a fechaduras, boilers, fios e conexões, passando por madeiras, cimento, ferro, cabos de aço, vidro, metais, alumínio, registros, disjuntores, sem falar de móveis e eletrodomésticos, tintas, embalagens, jardinagem e decoração, com o grande detalhe de que tudo isto é produzido pelo mercado interno?
 
Deu para enxergar o tamanho da cadeia envolvida e entender porque até agora os europeus e americanos ainda não se recuperaram e nem vão se recuperar logo? Lá existe hoje enorme excesso de oferta e nenhuma demanda, já que a tênue linha que regula este mercado foi destruída por uma crise irresponsável produzida pela ganância do mercado de capitais e banqueiros, mas quem está “pagando o pato” é aquela parcela da população, os tais 99,5% que não participaram dos lucros e estão arcando como os prejuízos. Aqui, até 2016, com o investimento de U$ bilhões e a crise lá fora, estaremos no foco das atenções com todos querendo nos vender algo e com o preço dos imóveis em alta. Como todos sabem que estamos construindo “30 anos em 5” no mercado imobiliário, que é o atual motor da economia no Rio responsável por centenas de milhares de empregos, como ficará a construção civil, a indústria imobiliária e todas as empresas de diversos portes periféricas a estes negócios no pós-olímpico com o mercado saturado de imóveis, incomensuráveis problemas no trânsito e nos transportes de massa, falta de grandes obras infraestruturais, enormes dívidas dos grandes eventos para pagar e outras consequências que comprometerão o caixa municipal e estadual?
 
Aí é que poderiam, veja bem que coloco “poderiam”, entrar os aspectos imateriais de uma Olimpíada, como “o centro de treinamento de atletas de alto nível, a universalização das aulas de inglês nas escolas públicas, a participação da população na conservação da cidade, a profissionalização dos serviços e aumento no turismo e etc. (?)” Afinal, o que significa o turismo para o Rio e seus habitantes? Esta é a grande pergunta.
 
Segundo dados da Riotur, a cidade deve atrair 3 milhões de visitantes (?) gerando uma renda (?) de U$ 2,2  bilhões neste verão. É triste que a vocação natural do Rio, considerada de forma unânime como a maior do mundo e que bem trabalhada se converteria no motor da economia do RJ e do Brasil, seja medida sem apresentar uma base de dados crível embora os profissionais envolvidos sejam todos sérios e competentes, mas não lhes são dadas condições para que exerçam seu trabalho com dignidade. Não existem pesquisas como em Barcelona, Madrid, Paris e outras cidades turísticas que as usam para melhorar cada vez mais a atividade que por ser extremamente rendosa, pede profissionalismo total, coisa que não passa pela cabeça de nossos executivos que enxergam nas estatísticas um empecilho para que eles possam “supostamente” praticar seu esporte favorito: o desvio de verbas públicas. Reparem que elas não existem em nenhum setor, porque isso implicaria em transparência o que inibiria seus “supostos” trambiques. Esses dados da Riotur não refletem a realidade. Indiscutivelmente, o que pode provocar a revitalização da economia do Rio é a indústria turística desenvolvida em conjunto por toda a sociedade que só tem a ganhar e em todos os sentidos. Por que então não adotar um turismo profissionalizado como o motor do Porto Maravilha? Este decolaria imediatamente. Mas não interessa, nem ao poder público, nem ao empresariado que o apóia e que dirige nossa mídia.
 
Com planejamento de curto, médio e longo prazos centrados na indústria turística que, como repito sempre, é a única que movimenta todos os segmentos da sociedade simultaneamente, produziremos qualidade de vida de alto nível em todos os serviços públicos e privados, com retorno no curtíssimo prazo, provocando substancial aumento da renda per capita, estimulando a criação de uma conscientização cidadã que preserve o patrimônio material e imaterial, além de apresentar um futuro crível que empolgará nossa juventude animando todos a sentirem-se inseridos, perenizando tudo isso junto com nossa privilegiada beleza natural.
 
Sem falar em milhões de novos empregos com a criação de um ambiente propício a proliferação de centenas de milhares de micro e pequenas empresas que serão criadas sucessivamente para atender as demandas turística e cidadã. Estamos falando de um desenvolvimento programado, através de um plano diretor que apresentará com clareza aos investidores os rumos do RJ, dentro de uma qualidade de vida voltada para satisfazer os moradores, atrair visitantes, empreendedores, fábricas, indústrias e todo o setor internacional de serviços para atender o aumento de demanda que se formará. O Rio é considerado um museu a céu aberto e todos poderão se engajar nas milhares de oportunidades de negócios que aparecerão voltadas para atender não só nossos visitantes como também uma população que passara a ter poder econômico que virá de um progresso induzido por uma sociedade ativa e atuante na defesa de seus interesses.
 
Por que os 99,5% da população que trabalham quase 5 meses para pagar seus impostos e desta forma sustentar esta corrupção que nos envergonha não se unem para cortar o mal pela raiz? Sem violência. Vejamos aquela manifestação dos bombeiros e policiais que reuniu mais de 10 mil pessoas e que não teve uma linha nos jornais, porque, entre outros motivos, foi “coordenada” pelo ex-governador, que consegue ser mais corrupto do que o atual. Qual era a proposta dos grevistas? Queriam aumento, já sabendo que o estado irá exibir uma planilha provando que não há espaço para isto. Será que esse é o caminho certo ou podemos apresentar uma proposta fechada, aprovada pela união dos mais diversos setores da sociedade, que leve a uma real revitalização da economia e que será fiscalizada por todos por apresentar transparência total como instrumento regulador, inibindo a corrupção e privilegiando os funcionários públicos concursados que passariam a gerir os orçamentos de cada setor, independentemente, valorizando o patrimônio físico de suas secretarias e os seus planos de carreira ao mesmo tempo em que abririam um canal de comunicação com a população para acabar com esta burocracia que prejudica o ambiente de negócios dificultando que a economia formal se desenvolva em toda a sua plenitude e enquadrando estes políticos? Esses políticos não apresentam planejamento e só prometem sem ter como cumprir. Que tal mudarmos este quadro?
 
Como outras cidades que tinham problemas iguais ou piores do que os nossos, que se uniram e desta forma conseguiram se reinventar com ética, qualidade de vida, transparência e conscientização cidadã. Não existe democracia sem estes preceitos, e como estamos rigorosamente todos no mesmo barco, é só uma questão de começarmos a dialogar e unirmos as diversas categorias, porque todos querem mudanças positivas.
 
Cada setor como educação, saúde, transporte, saneamento e demais passarão a ter os recursos financeiros interligados por um planejamento de curto, médio e longo prazos e coordenados pelos seus especialistas concursados que se responsabilizarão judicialmente por eles recebendo incentivos por metas cumpridas, divididas entre suas equipes. Nesses trabalhos executados com transparência podem ser aproveitados os professores universitários que aumentariam seus rendimentos com o trabalho de pesquisa e desenvolvimento de projetos para órgãos ou comunidades. Seus alunos aprenderão trabalhando na prática e desenvolverão atividades paralelas que se tornarão empresas desde que se revelem úteis a coletividade. A âncora será nossa vocação natural, com seus múltiplos desenvolvimentos, podendo ser aplicado imediatamente na revitalização da área portuária, levando o desenvolvimento socioeconômico, cultural e ambiental, tão sonhado a toda a cidade, inclusive favelas, subúrbios, periferia e arredores, dentro um planejamento que virará plano diretor ao apresentar de forma clara soluções pertinentes aos problemas existentes por demais conhecidos, para os próximos 30 anos, além de engajar toda a população nesta transformação. São Paulo já esta querendo se planejar para 2040, mas dentro de um plano de metas que, como sabemos, não funcionou.
 
Com um turismo forte e uma população que participa ativamente, além da diminuir muito a corrupção, as novas receitas irão aumentar em bilhões, permitindo as tão necessárias obras infraestruturais e a recuperação da excelência dos serviços públicos e privados levando o Rio à vanguarda mundial em curto prazo, de forma sustentável e autossustentável, dotando-o de uma qualidade de vida única e sem gentrianismos, pois poderemos criar empregos até para aquelas parcelas da população mais desfavorecidas, comprovadamente.
 
Acabando com os currais eleitorais e a violência porque a população passará a ser atuante e a democracia será fiscalizada de forma transparente pelos seus cidadãos orgulhosos em participar ativamente da construção do seu futuro e no de seus filhos.
 
Enquanto isso, aquela aliança política que governa sem escândalos, como nosso alcaide descaradamente sustenta, continua aprontando: na eminência de passar pela maior epidemia de dengue de sua história, porque só na primeira semana de 2012 a incidência foi 44% maior, acintosamente a prefeitura resolveu premiar com R$ 12,9 milhões para cuidar de assunto tão sério uma empresa que “supostamente” não entende nada de controle de vetores e pragas, colocando em risco sua própria população. Através de uma licitação pública “dirigida”, com exigências esdrúxulas, que nunca foram feitas no Brasil, em apenas 17 dias uma empresa de alimentação sem experiência comprovada foi escolhida para preservar nossa saúde, fato condenado de forma unânime pelos especialistas. Claro que essa empresa entre 2008 e 2011 aumentou sua participação na prefeitura em 73%, sendo que ela deve ser muito bem relacionada, pois presta serviços em diferentes secretarias, mesmo com seu representante legal sendo o mesmo de duas ações de improbidade administrativa e danos contra o erário, com outra firma, mas num outro setor, educação. Não é espetacular?  Até quando estas indicações políticas que permitem estas “supostas” coincidências?
 
Não podemos aceitar que menos de 0,5% possam debochar diariamente da nossa passividade. Acorda, Rio; porque nós somos a maioria e não podemos perder uma oportunidade única de nos reinventarmos. Esta deveria ser a nossa década, e estão roubando-a de nós.

1 comentário:

Anónimo disse...

Ótimo texto.