terça-feira, 17 de abril de 2012

O Rio de Janeiro e o desenvolvimento macroeconômico

Por José Paulo Grasso



Teremos eleições em cinco meses. E nos perguntamos se, afinal, a cidade tem uma proposta crível de futuro ou estamos diante de uma propaganda enganosa descarada, que já consumiu assombrosos R$ 2 bilhões na rubrica comunicação, o que na verdade é verba pública gasta irregularmente em publicidade quando poderia ter tido uma aplicação muito melhor, não?
Aquela teoria de que o Rio estava num “ciclo virtuoso” foi desmentida em um único artigo meu, publicado no Observatório da Imprensa, e não se tocou mais no assunto na imprensa carioca.
Os ingressos no Rio são os mais caros do país e do mundo, porque cerca de 90% do público paga meia entrada. Assim, as pessoas se veem praticamente “obrigadas” a falsificar documentos para ter acesso à cultura. Quando uma situação como essa está banalizada, é preciso dizer alguma coisa mais?
Como sabemos que 83% dos municípios brasileiros não conseguem gerar nem 20% de suas receitas e que não existe a menor preocupação por parte dos administradores públicos em mudar este quadro ou investir em planejamento de curto, médio ou longo prazos, fica fácil perceber que nada mudou, embora estejamos diante de uma possibilidade única de nos reinventarmos, como outros lugares que tinham problemas iguais ou piores do que os nossos conseguiram.
É triste a constatação de que as atuais lideranças, que não nos representam, não querem transformações e sim mais do mesmo, porque se algo mudar, seus mandos (ou desmandos), que já duram décadas, irão por água abaixo. Mas, o que a sociedade e os empresários pensam disto? Por que a imprensa está amordaçada, diante de escândalos sem fim?
Recentemente, com a descoberta de que o país está sofrendo um acelerado processo de desindustrialização, o empresariado botou a boca no trombone e forçou o governo a se pronunciar, o que redundou num pacote imediatista de redução de impostos que foi criticado por todos, mas ninguém, nenhum destes industriais, teve a coragem de pedir um planejamento de curto, médio ou longo prazos, com âncoras sólidas, para gerarem metas críveis, como é feito na administração privada de suas empresas e em todas as economias que funcionam. Notoriamente, somente assim poderemos fugir dos já tradicionais voos de galinha que caracterizam tristemente nossa economia. E por que este ruidoso silêncio na mídia e na sociedade?
Conforme constatamos com a crise mundial de 2007/08, o neoliberalismo e todas as outras ideologias foram para o beleléu. O estado-nação está de volta, junto com a macroeconomia em que o poder público é que determina os rumos econômicos e a qualidade de vida da sociedade, porque a crise é séria, está longe de terminar e os economistas não conseguem acertar uma. Uma situação assim exige reflexão e o aproveitamento lógico das vantagens naturais.
O melhor exemplo é o Equador que, por estar numa posição geográfica privilegiada (é cortado ao meio pela linha do equador), possui uma primavera eterna, o que lhe proporcionaria enorme vantagem ao se voltar para a produção de flores. Só que era necessário um aeroporto para escoar a produção, além de galpões refrigerados para estocá-las até o embarque. Em função dessas lacunas, ninguém plantava nada e esta vocação natural era desperdiçada, até a hora que o governo entendeu que com investimentos se geraria empregos e renda em condições excepcionais. Hoje, esta engenharia macroeconômica que uniu a sociedade local em prol de uma agricultura voltada para a exportação mundial e suas benesses eternas é a maior força do PIB equatoriano após a extração de petróleo. Simples, não?
E aqui, que temos o maior potencial turístico do mundo, apontado de forma unânime, quando iremos desenvolver macroeconomicamente uma indústria que é considerada a maior do mundo, exatamente porque movimenta todos os setores da sociedade simultaneamente, produz emprego e renda no curto prazo com retorno do capital investido em cerca de dez vezes em apenas dois anos, sendo que em todos os lugares onde foi utilizado como instrumento de transformação obteve sucesso incontestável. Repare que iremos gastar bilhões de reais para produzir os eventos mais midiáticos do mundo, voltados para a expansão da atividade turística e nada está sendo feito para desenvolver a atividade e levar o Rio à vanguarda mundial do setor, proporcionando aumento radical da renda per capita e ganhos em todos os sentidos da qualidade de vida que se eternizarão desde que bem administrados para toda a sociedade.
O que estamos vendo no Rio? Além da total falta de planejamento voltada para a recuperação econômica de uma cidade devastada por mais de meio século de incúria administrativa, estamos assistindo inertes a um verdadeiro atentado ao desenvolvimento da economia local, pois, como sabemos, os dois pilares que a sustentam são a indústria imobiliária e a construção civil. Antigamente era preciso cerca de 90 pessoas para que uma fazenda produzisse e hoje este número abaixou para quatro, o que torna o êxodo rural uma realidade inchando as grandes cidades cada vez mais. Em qualquer lugar do mundo os subúrbios e periferias são preparados para alimentar um mercado imobiliário que vive em constante expansão, produzindo os necessários empregos para estabilizar a economia local. Aqui não se cobra IPTU nesses locais para não se ter que fazer a conservação e o resultado é o que estamos assistindo estupefatos: uma radical marginalização dessas áreas que deveriam prover o desenvolvimento socioeconômico, cultural e ambiental da cidade em sua expansão planejada. O que resulta num aumento absurdo dos preços dos imóveis e dos aluguéis na Zona Sul, única parte da cidade com alguma qualidade de vida, já que hoje o Rio é o centro das atenções mundiais por termos bilhões de reais sendo investidos na cidade, fato raro num mundo em crise, onde quase não há oportunidades de negócio. Isto não se sustentará no pós-2016, porque a economia municipal não tem como bancar os altos investimentos que provocam esta especulação irreal.
Pior, nestes lugares, como não há a “obrigação” municipal de zelar pelo patrimônio público, os “prefeitinhos” (como o próprio Eduardo Paes) se aproveitam deste ambiente para produzir um descarado clientelismo ao trocar votos por iluminação pública, poda de árvores, tapar buracos e outras mazelas que são oportunamente estimuladas para produzir descaradamente futuros vereadores, prática que tinha sido condenada pelo atual prefeito que assumiu compromisso público ao dizer que impediria que isso, se se repetisse na sua administração, fato que será burlado porque nada menos do que sete pessoas de sua equipe já tornaram públicas suas candidaturas. Que vergonha, Eduardo!
Vislumbrando o futuro
A maior aposta da empresa Vale do Rio Doce na hora de recrutar trabalhadores não está no salário nem no pacote de benefícios oferecidos, mas na possibilidade do jovem “vislumbrar uma carreira”, afirma sua diretoria.
E aqui no Rio? Qual é a perspectiva de futuro? Nenhuma? E a esperada revitalização da economia? Não temos projeto? Com isso, a violência explode, como está sendo noticiado, já que as UPPs sozinhas não darão conta da política pública de “enxugar gelo” com o famoso “cobertor curto” que, ao cobrir aqui, descobre ali… Em todo o mundo pós-crise, qualquer projeto tem necessariamente que apresentar o retorno do investimento, preocupação que aqui inexiste e, para piorar, os projetos sociais em andamento, além de não proporcionarem retorno do capital investido, preparam as pessoas para funções em que cruelmente não existe empregabilidade, porque notoriamente o Rio atravessa mais de meio século de sérios problemas infraestruturais que faliram os setores públicos e privados e, incrivelmente, não há um planejamento para revitalizar sua economia. Não é à toa que até a pesquisa “chapa branca” do Rio Como Vamos mostrou que não houve modificação significativa de cenário onde foram implantadas as UPPs. E aí, vamos eternizar essa situação ou vamos nos desenvolver com qualidade de vida, já que temos uma chance única no mundo? E o empresariado, a sociedade, os movimentos sociais, os articulistas e os formadores de opinião? Ao não se manifestarem estão apoiando que essas mazelas morais se eternizem e infernizem o nosso futuro.
O neoliberalismo hoje é combatido em todo o mundo por ser uma ideologia disfarçada de ciência econômica que perpetua o atraso ao fomentar a instabilidade financeira, a corrupção e ainda causar baixo crescimento ao produzir miséria e concentração de renda. Pois bem, aqui no Rio é este o conceito utilizado pelos poderes públicos ao invés de criarem um ambiente propício a proliferação de milhares de micros e pequenas empresas, o que criaria um mercado para a atração de pólos industriais e traria desenvolvimento sustentável. Os escândalos não param de explodir nas OSs, OSCIPs e ongs voltadas para esvaziar os serviços públicos que deveriam ser prestados pelos poderes constituídos. Com a descoberta do pré-sal, todas as empresas ligadas ao setor têm que necessariamente se instalar aqui, que virou uma espécie de Eldorado, mas, mesmo assim estamos vendo o estado e o município gastarem “rios” de dinheiro público para facilitar ainda mais estas empresas, que geram um mínimo de empregos em detrimento de se produzir um desenvolvimento amarrado em uma âncora sólida que permita metas críveis e estimule o espírito animal dos empreendedores, trazendo os tão necessários empregos aliados a um desenvolvimento autossustentável.
Por que permitimos isso se seremos os principais prejudicados, já que nossos jovens, ao se formarem, não encontram um mercado de trabalho que os absorva, obrigando-os a prestar concursos públicos e a viver uma vida sem possibilidades de desenvolvimento profissional?
Na Barra, a meta dos “trinta anos em cinco” está acintosamente sendo feita sem observar os parâmetros de crescimento urbano, o que está produzindo um verdadeiro inferno no trânsito, o que levará esta região ao caos, porque milhares de novos veículos serão atirados nas já congestionadas ruas e avenidas, sem falar da infraestrutura dos serviços públicos, pois a previsão é de se construir em cerca de dois milhões de m². Estranhamente, nenhum consultor em engenharia de tráfego se manifesta, em lugar nenhum do mundo uma loucura como essa é permitida, pois acima de determinado número de vagas de carros tem que ser feito um estudo e as obras necessárias são bancadas pelos empreendedores do negócio imobiliário. Por que nenhum jornal entrevista um especialista em tráfego independente?
O transporte de massa é utilizado por apenas 16% da população e a extensão do metrô está causando a maior celeuma, porque não tem estimativa de custos, não atende a expectativas da sociedade e sim de um evento que durará 15 dias, deixando uma conta que levará décadas para ser paga.
Por que essa necessidade de se fazer tudo sem planejamento? A quem isso interessa? Por que temos que ter um pós-2016 trágico? Será que isso tem alguma relação com o fato de que os financiadores de campanha estão ligados a essa especulação imobiliária desenfreada?
O Porto Maravilha, que não decola de jeito nenhum, mesmo com todos os incentivos e isenções, é ainda mais malévolo. O dinheiro dos CEPACs teria que ser gasto necessariamente em ampliar as vias públicas, que sabidamente já estão saturadas mesmo com o baixo índice de ocupação urbana da área que irá, irresponsavelmente, de uma hora para outra, receber mais de cinco mil edificações, a maioria com até 50 andares, o que promoverá um incremento na área de dezenas de milhares de veículos e milhões de pessoas, sem contar a expansão anual de mais de 40 mil viaturas. E o que estamos vendo? Uma licitação nebulosa que irá consumir bilhões para destruir um viaduto que funciona para refazê-lo subterrâneo, a um custo ainda ignorado, sem obviamente atender as atuais e futuras necessidades do local, o maior eixo de circulação de veículos da cidade. Com o detalhe de que a ponte Rio-Niterói tem que ser duplicada junto com a Avenida Brasil. Mas e o planejamento, existe um? E de onde virá esse dinheiro? Já se passaram vergonhosamente mais de trinta anos e o gargalo da saída da ponte ainda não foi solucionado.
Como podemos permitir uma atitude suicida municipal dessas para que alguém ganhe e todos percam? Volto a repetir, o que a sociedade tem contra a obrigatoriedade de se apresentar um planejamento onde se possa comprovar um futuro digno, com qualidade de vida e, fundamentalmente, onde todos ganhem e em todos os sentidos, conforme tem que ser? Adivinhe, leitor, por que até agora nenhum empresário meteu a mão no seu próprio bolso e fez um investimento na região mesmo com todas as isenções fiscais, financiamentos do BNDES e benesses prometidas?
A própria mídia, ao anunciar os “projetos municipais”, já os enterra, quando avisa que os hotéis 5 estrelas construídos próximos a rodoviária jamais serão competitivos, tendendo a falirem, e o que o complexo de prédios que os circundará no meio do nada e de lugar nenhum serão objeto de tentativa de venda através de financiamento municipal, via meio bilhão de reais que serão desviados do fundo de previdência para atender servidores municipais que optem por morar ali, o que não animou ninguém por enquanto. Os BRTs que circularão na Avenida Brasil também já vêm carimbados com a obsolência, porque ao serem inaugurados, já não conseguirão atender à demanda de seus usuários, fato que vem sendo denunciado há anos e que levou Curitiba a aposentar sua iniciativa pioneira e investir em VLTs. Até agora tudo o que os poderes constituídos apresentou foi desmoralizado, pois as intervenções apresentadas carecem totalmente de estudos de viabilidade e de retorno do capital investido, como o Píer para os transatlânticos, que não terá área de manobra que permita o desembarque organizado dos passageiros, o Maracanã com seu custo absurdo de mais de R$ 1,5 bilhões gastos nos últimos anos e que não foi preparado para dar retorno, como, por exemplo, a Allianz Arena, que dá lucro diariamente na Alemanha, o centro de convenções internacional no Mangue que é  uma piada de mau gosto, etc. Etc. Etc.
Ou seja, BRTs, elefantes brancos, remoções de famílias na marra, Centro de Convenções Internacional que ignoram as necessidades dos turistas que têm o maior gasto médio do mundo, o que o inviabiliza já na planta, Metrô que disponibiliza um m² para seis passageiros “no maior conforto”, neoliberalismo e escândalos em cima de escândalos nos mais diversos setores da economia com total impunidade só acontecem hoje em dia nos países mais corruptos e atrasados do mundo. O que a sociedade, os empresários, os estudantes, os formadores de opinião e outros segmentos da população acham disso?  Por que a imprensa não denuncia e investiga até o final, como faz quando o malfeito não é aqui? Não está na hora de mudanças? Acorda, Rio!
A única novidade efetiva administrativa é que a prefeitura conseguiu um empréstimo do Banco Mundial, o maior já feito no mundo, que permitiu diminuir os juros da dívida com a união de 9% para 6%, o que permite uma sobra de caixa anual de cerca de R$ 360 milhões, mas que, diga-se de passagem, já está toda carimbada em projetos apresentados ao banco e que não darão retorno nem social e nem do capital investido. Por que ninguém fala isso? O Rio hoje recebe do governo federal para investimentos o equivalente a R$ 5,72 por eleitor, mesmo com os eventos que vai sediar nos próximos anos, como a Copa e a Olimpíada. Para termos de comparação, São Paulo, a maior cidade do país, faturou R$ 0,62 por eleitor.
Como não há a menor preocupação com a autossustentabilidade da economia, como ficaremos no pós-2016, com o final das obras que hoje mantém a economia funcionando, que coincidirá com o término dos bilhões em investimentos, que além de não serem pensados para oferecerem retorno, apresentarão uma conta bilionária? O mercado estará inundado de imóveis, o boom imobiliário cessará junto com as obras infraestruturais, milhares de pessoas ficarão desempregadas, falência das micro e pequenas empresas prestadoras de serviços ao setor imobiliário e suas periféricas num cenário muito parecido com o grego atual. Mesmo com todo o alarde publicitário, o Rio continua declinando, como provam todas as pesquisas nas mais diversas áreas dos serviços públicos, cada vez mais próximo dos feudos maranhenses, ao invés de apresentar uma realidade condizente com o status de ser a segunda maior economia municipal do país. Será que é isso que a sociedade ambiciona para o pós-2016?
Como um líder sindical ou de qualquer categoria classista poderá ter a decência de promover uma greve, se será confrontado com uma planilha pública, mostrando que não há horizonte para aumento de qualquer categoria, o que nos condena a ter uma economia estagnada que garante a eternização dos feudos políticos que passam de pai para filho enquanto a situação da população vai de mal a pior? Por que a sociedade não se une para exigir uma proposta de futuro crível, que pode ser alcançada em curto prazo, via aproveitamento de nossa vocação natural, reconhecida mundialmente?
Diz o ditado popular que “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”, mas, se nos unirmos… “O bicho some!” Que tal fazermos um projeto que une toda a sociedade, apresentando um futuro crível?
A indústria do turismo não ocupa somente hotéis, restaurantes e museus. Ela movimenta tudo! Cidades turísticas chegam a ter mais de 50% do seu PIB voltado para atender a atividade. Aqui ela representaria uma mudança de paradigma no sentido de passarmos de atitudes subdesenvolvidas para o topo dos serviços em nível mundial, a começar pelas áreas de transporte, saúde, segurança pública, meio ambiente e educação, que teriam uma cobrança muito maior apoiada por uma renovação total da infraestrutura que será acompanhada e cobrada por todos.
Como tudo é turismo, acontecerá um aumento de ofertas de trabalho compatível com a demanda atualmente reprimida, gerando uma perspectiva de futuro em que o jovem poderá trabalhar pelo seu futuro, produzindo mudanças comportamentais muito interessantes onde a ética e os valores sociais renascerão arrasando a violência atual, pois todos só terão a ganhar e em todos os sentidos. Poderemos receber 25 milhões de turistas em curto prazo, desde que tenhamos um planejamento que una toda a sociedade, pois temos potencial reconhecido para que isso aconteça e que, uma vez desenvolvido, gerará uma permanência média elevada com gasto médio diário acima de U$ 300,00, o que proporcionará, além de empregos de qualidade, um aumento de arrecadação que tornará o Rio completamente autossustentável.
Depois da lambança olímpica na Grécia e na China o COI tem interesse em capitalizar uma herança digna de nota. Afinal, qual será o legado olímpico do Rio? Só nós podemos influenciar o nosso futuro! Acorda, Rio! A hora da mudança é agora. Ou vamos ficar para sempre com a impressão de termos perdido uma oportunidade única de reinventar a nossa “Cidade Maravilhosa”?

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